É direito de toda criança e adolescente conhecer suas origens e ter sua paternidade reconhecida. Mas, no Brasil, e em especial na Região Norte do País, o número de crianças registradas sem o nome do pai vem crescendo nos últimos anos. Alertar para a importância legal e social do reconhecimento de paternidade tem se tornado uma necessidade cada vez maior, afirma a defensora pública Hélvia Castro, coordenadora da área de Família da Defensoria Pública do Estado do Amazonas (DPE-AM).
No Amazonas, 23.572 crianças foram registradas só com o nome da mãe, de janeiro de 2018 a dezembro de 2021. Os dados são da Associação dos Notários e Registradores do Estado do Amazonas (Anoreg/AM).
“O nome é um direito da personalidade e como tal protegido, pois individualiza a pessoa, distinguindo-a de outras. Consubstancia-se no direito de conhecer sua origem, sua ancestralidade, sua ascendência. Além disso, o reconhecimento de paternidade garante ao filho a possibilidade de conviver com o pai, manter com este uma relação paterno filial saudável, de amor, afeto e solidariedade familiar, bem como as consequências lógicas da filiação, como direito aos alimentos e condição de herdeiro necessário”, afirma a defensora.
O reconhecimento voluntário de paternidade é um procedimento simples e com pouca burocracia e, apesar disso, o número de crianças sem o nome do pai na certidão de nascimento cresceu pelo quarto ano consecutivo no Brasil. De acordo com dados da Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil), quase 100 mil crianças nascidas em 2021 não têm o nome do pai no registro civil e não terão a figura paterna ao seu lado neste domingo, quando é celebrado o Dia dos Pais.
Defensoria
Para incentivar o reconhecimento de paternidade, as Defensorias Públicas de todo o País realizaram em março deste ano um mutirão de atendimentos em diversas cidades com foco nesse serviço. No Amazonas, a ação foi realizada em Manaus, na sede da DPE-AM e resultou em 400 atendimentos.
A defensora Hélvia explica que o reconhecimento voluntário é “super simples”, quando não é necessário ingressar com uma ação judicial. “O pai pega a declaração de nascido vivo do filho na maternidade e vai ao cartório de registro de pessoas naturais e efetua o registro. Ou então, mesmo já havendo o registro, feito só pela mãe, o pai pode ir ao cartório e registrar depois também de forma voluntária, informando a razão. Contudo, se o filho já tem pai registral ou se tem alguma dúvida sobre a paternidade biológica, aí sim, tem que ingressar com uma ação de investigação de paternidade”, explica.
Hélvia esclarece ainda que mesmo durante a ação judicial, na primeira audiência, ainda há a possibilidade de reconhecimento voluntário e o processo pode ser encerrado neste momento. “Caso não haja esse reconhecimento voluntário, aí sim, é realizado um exame de DNA”, disse.
Para a defensora, há diversas razões para o crescimento do número de mães que registram seus filhos apenas em seu nome e a carência de acesso à informação é uma delas.
“Então, isso mostra o quanto ainda é necessário um trabalho de informação e de conscientização dos pais da importância da figura paterna na relação filial e também da responsabilidade dos pais na criação e educação dos filhos. O pai é igualmente responsável, tanto quanto a mãe. Tem uma frase que demonstra bem esse pensamento que é: ‘ter um filho não é difícil. Difícil é ser pai’”, afirmou.
Na DPE-AM, o atendimento para reconhecimento de paternidade é realizado pelas Defensorias de Família. Para esse serviço, é preciso agendar o atendimento por meio do Disk 129, serviço telefônico gratuito que funciona de segunda à sexta-feira, das 8h às 14h.
Cenário no País
Recentes publicações da imprensa com base em dados dos cartórios mostram que o percentual de pais ausentes no Brasil vem crescendo desde 2018. Até então, o recorde havia recaído sobre os dois anos acometidos pela pandemia da Covid-19, 2020 e 2021. No entanto, os quatro primeiros meses de 2022 já conseguiram ultrapassar o índice de recusa à paternidade, se comparados ao mesmo período nos anos anteriores.
Entre janeiro e abril de 2018, aproximadamente 5,3% dos registros de nascimentos foram feitos apenas com o nome da mãe (51.176 de 954.869 documentos formalizados). Em 2020 e 2021, este índice passou para a casa dos 5,8% e 5,9%. No mesmo período em 2022, o percentual de pais que renegaram a paternidade saltou para 6,6%, o maior até agora.
A região Norte do País é a que concentra maior número de pais ausentes em relação ao total de registros (10%), seguida do Nordeste (7%), Centro-Oeste e Sudeste (6%) e Sul (5%). A tendência se repete, assim como nos dois anos anteriores. No País inteiro, são 56.931 crianças que crescerão sem o registro do nome da figura paterna.
Como registrar
*Reconhecimento de paternidade voluntário*
– Pegar a declaração de nascido vivo na maternidade onde a criança nasceu.
– Levar ao cartório de registro de pessoas naturais e registrar a criança em seu nome.
Reconhecimento de paternidade não voluntário (ou com dúvida sobre a paternidade
– A mãe ou o filho deve ingressar com uma ação de investigação de paternidade.
– Caso não possua condições financeiras para arcar com o processo judicial, a ação de investigação de paternidade pode ser movida por meio da Defensoria Pública.
– Mesmo no processo, durante a primeira audiência, é possível o reconhecimento voluntário.
– Caso não haja o reconhecimento voluntário, será requisitado um exame de DNA para a confirmação da paternidade biológica.
– Comprovada a paternidade, haverá o acréscimo do nome do pai na certidão de nascimento da criança ou adolescente.
– Caso a pessoa não tenha condições financeiras de arcar com o custo do cartório, a Defensoria também pode requisitar a gratuidade do serviço.
A primeira certidão de nascimento é gratuita
– Documentação para obter a certidão de nascimento:
Apresentar ao cartório documento de identificação do pai e da mãe e a declaração de nascido vivo da criança, que é obtida na maternidade.
FOTO: Evandro Seixas/DPE-AM