Estima-se que 80 em cada 100 pessoas terão um episódio de lombalgia (também chamada de dor nas costas) ao menos uma vez na vida. E esse número vem crescendo ano a ano no mundo todo, segundo os dados mais recentes do estudo Global Burden of Disease (GBD) publicado no The Lancet Rheumatology. O levantamento mostra que 619 milhões de pessoas sofreram com o problema em 2020 (o equivalente a 10% da população mundial) e, até 2050, esse número deve chegar a 843 milhões de pessoas – um aumento de 36%.
Diante de uma escassez de tratamentos eficazes e da dependência contínua de acompanhamento e cuidados de saúde, o relatório diz ainda que esse aumento das queixas é mais dramático nas populações socioeconomicamente menos favorecidas. Além disso, acredita-se que esses dados ainda estão subestimados porque não levaram em consideração o impacto causado pela pandemia de Covid-19 – quando a prevalência e a intensidade da dor lombar aumentaram consideravelmente diante do aumento da inatividade física, bem como a piora da ergonomia do trabalho em casa.
E sentir dor nas costas não é algo novo, vem desde a evolução da espécie. Segundo o ortopedista Mario Lenza, gerente-médico da Ortopedia do Hospital Israelita Albert Einstein, a lombalgia é uma doença muito comum entre os humanos, pois ficar em pé, na posição vertical, não é tão fisiológico e confortável para a coluna.
“A evolução da espécie fez com que a nossa coluna tivesse uma sobrecarga, o que naturalmente faz aumentar as queixas de dores. Associado a isso, atualmente, temos má postura, sedentarismo e menos atividades físicas, mais tempo em frente às telas, vícios de postura e enfraquecimento muscular, além do envelhecimento da população”, afirmou o especialista.
Principais tipos de lombalgia
Toda dor na região lombar é uma lombalgia e ela pode ser dividida basicamente em três tipos: lombalgia mecânica, que engloba a maioria das doenças da coluna e normalmente está associada à problemas de postura; lombociatalgia, que é a dor lombar que irradia para os membros inferiores por causa da compressão de uma raiz dos nervos e costuma estar relacionada a hérnias de disco e a estenose do canal lombar, que é o envelhecimento da região baixa da coluna e pode alterar o canal lombar causando um estreitamento da região por onde passam as raízes nervosas. Costuma atingir mais os idosos acarretando a claudicação neurogênica (dificuldade para caminhar). Podem existir outras causas menos frequentes, como tumor e infecção.
Para cada doença existe um tratamento específico e, segundo Lenza, para os casos da lombalgia mecânica (que é a mais comum) o mais consagrado é o tratamento funcional com fisioterapia e exercícios. “Quando esses pacientes são tratados adequadamente, o tratamento funcional costuma resolver. Se não houver sucesso, existem algumas terapias com infiltrações nos locais de dor para amenizar os sintomas e deixar o paciente mais preparado para as sessões de fisioterapia”, afirmou o médico. A indicação cirúrgica, ressalta Lenza, é uma exceção e deve ser avaliada individualmente.
Ouvir uma segunda opinião
Mas não é essa a realidade da ortopedia e a maioria dos pacientes ainda são enviados para a cirurgia sem necessidade. Há 12 anos o Einstein implementou um programa chamado 2ª Opinião da Coluna para que os pacientes de fora do hospital que recebessem alguma indicação de cirurgia na coluna pudessem ouvir uma segunda opinião de um grupo multiprofissional (fisiatras, ortopedistas especialistas em coluna, neurocirurgiões e fisioterapeutas) para reavaliar a recomendação cirúrgica.
Nesse período, 12.669 pacientes foram encaminhados para participar do programa. Desses, um pouco mais da metade aceitou ser avaliado (6.566 pessoas / 52%) e 6.103 não quiseram ouvir uma outra opinião. Entre os que passaram pela segunda avaliação, 69% (4.529 pacientes) foram encaminhados para um tratamento funcional e conservador e somente 31% deles (2.037) realmente tinham indicação de cirurgia, ou seja, somente um terço tinham casos mais complexos.
Todos os pacientes que foram para o tratamento não cirúrgico são acompanhados e reavaliados por um período de dois anos para análise da qualidade de vida, da função da dor e do desfecho clínico do tratamento. Segundo Lenza, somente 5% deles realmente precisaram de cirurgia após esse período.
“Esses pacientes são encaminhados para um acompanhamento multiprofissional. O tratamento conservador é importante, mas exige mudanças de hábitos de vida. Há casos de pacientes com hérnia de disco, por exemplo, que tinham indicação de cirurgia. Mas se o paciente não tiver nenhum comprometimento neurológico com alteração de força motora, por exemplo, o tratamento da hérnia não tem indicação cirúrgica”, explicou o ortopedista.
Por atingir mais os adultos jovens e em idade produtiva economicamente, a dor lombar também está associada a casos de afastamento do trabalho e até aposentadoria por invalidez no Brasil. Dados de um estudo brasileiro publicado na Plos One apontam que cada pessoa fica, em média, de 88 a 100 dias de licença por ano por causa de dores nas costas. As despesas com saúde envolvidas (incluindo consultas, diagnósticos, cirurgias, internações hospitalares, órteses, próteses e outras despesas) foram estimadas em US$ 460 milhões. “A lombalgia tem que ser tratada e os tratamentos com reabilitação são bastante resolutivos”, afirmou Lenza.
Prevenção
A boa notícia é que é possível prevenir a lombalgia com hábitos simples como fazer atividade física regularmente (com moderação para aqueles que já têm histórico de dor nas costas) e não ser sedentário (o sedentarismo está associado ao enfraquecimento muscular); manter uma alimentação saudável; não ganhar peso (a obesidade está relacionada à sobrecarga mecânica); evitar ficar sentado mais de uma hora na mesma posição e não fumar (o tabagismo tem sido associado a alterações nos discos vertebrais e doenças na coluna).
“É importante que a pessoa entenda a origem da sua dor lombar. Não é todo mundo que precisa procurar um médico, mas aqueles casos em que há comprometimento neurológico ou quando a dor é refratária e crônica, é recomendada a avaliação de um especialista”, orienta o médico, ao acrescentar que a pessoa deve se preocupar com a dor que irradia para os membros inferiores e que causa algum déficit motor.
Fonte: Agência Einstein