Uma a cada 100 pessoas no mundo pode estar dentro do espectro autista, mas ainda há muito preconceito
Abril é o mês oficial de conscientizar a sociedade sobre o autismo, mas todos os dias e meses do ano são importantes quando se fala em inclusão. Alargar os horizontes, estender os braços e ampliar o entendimento de que essa condição do neurodesenvolvimento não é uma doença, e sim um funcionamento cerebral diferenciado. São formas de ser, existir e de conviver no mundo dentro da neurodiversidade, variedade de funcionamentos cerebrais em suas múltiplas possibilidades de existências.
O autismo é melhor definido como transtorno do espectro autista (TEA), justamente porque há uma grande variação de características e de comportamentos que essas pessoas vivenciam. Por esse motivo, há quem só receba o diagnóstico na fase adulta. Maria Matilde Lima é psicóloga clínica e foi diagnosticada com autismo em três momentos diferentes da vida.
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Depois de ser notada por uma professora de medicina como pessoa autista, foi convidada a participar do projeto de doutorado como objeto de pesquisa. “Aceitei participar com a condição de também ser pesquisadora e de opinar como é passar por uma investigação diagnóstica”, declara Maria Matilde. Ela conta que, depois de passar pela experiência com uma equipe multidisciplinar de profissionais da saúde, teve uma maior apropriação e entendimento do autismo.
A psicóloga explica que muitos autistas passam a vida se achando inadequados, pelas dificuldades com a socialização ao modo típico. Ela própria passou por isso. Não conseguia se colocar e, por vezes, foi vítima de muitas situações de abuso. “Fui muito mal compreendida pelas minhas dificuldades de dizer o que sentia e me senti só, na maioria das vezes”, declara a psicóloga que, hoje, atua clinicamente e trabalha com a abordagem da Terapia Cognitivo Comportamental
AUTISMO
Transtorno do espectro autista (TEA) apresenta várias características e comportamentos; entenda
Uma a cada 100 pessoas no mundo pode estar dentro do espectro autista, mas ainda há muito preconceito
Abril é o mês oficial de conscientizar a sociedade sobre o autismo, mas todos os dias e meses do ano são importantes quando se fala em inclusão. Alargar os horizontes, estender os braços e ampliar o entendimento de que essa condição do neurodesenvolvimento não é uma doença, e sim um funcionamento cerebral diferenciado. São formas de ser, existir e de conviver no mundo dentro da neurodiversidade, variedade de funcionamentos cerebrais em suas múltiplas possibilidades de existências.
O autismo é melhor definido como transtorno do espectro autista (TEA), justamente porque há uma grande variação de características e de comportamentos que essas pessoas vivenciam. Por esse motivo, há quem só receba o diagnóstico na fase adulta. Maria Matilde Lima é psicóloga clínica e foi diagnosticada com autismo em três momentos diferentes da vida.
:: Depois do laudo: famílias TEA se mobilizam por direitos e combate ao preconceito ::
Depois de ser notada por uma professora de medicina como pessoa autista, foi convidada a participar do projeto de doutorado como objeto de pesquisa. “Aceitei participar com a condição de também ser pesquisadora e de opinar como é passar por uma investigação diagnóstica”, declara Maria Matilde. Ela conta que, depois de passar pela experiência com uma equipe multidisciplinar de profissionais da saúde, teve uma maior apropriação e entendimento do autismo.
A psicóloga explica que muitos autistas passam a vida se achando inadequados, pelas dificuldades com a socialização ao modo típico. Ela própria passou por isso. Não conseguia se colocar e, por vezes, foi vítima de muitas situações de abuso. “Fui muito mal compreendida pelas minhas dificuldades de dizer o que sentia e me senti só, na maioria das vezes”, declara a psicóloga que, hoje, atua clinicamente e trabalha com a abordagem da Terapia Cognitivo Comportamental (TCC).
Além de TEA, Matilde também tem Altas Habilidades e Superdotação, com traços de TDAH, Síndrome de Savant e epilepsia, mas diz só ter tomado consciência sobre ser uma pessoa autista no final da faculdade, quando socializou o diagnóstico para não interromper o curso de psicologia. “As pessoas estranhavam o meu comportamento que parecia muito participativo e, em outros momentos, muito recluso. Era diferente da maioria”, declara.
A psicóloga defende que o autismo ainda é considerado deficiência justamente para dar respostas à sociedade preconceituosa e capacitista. “A invisibilização e não aceitação são brutais. Infelizmente, a maioria das pessoas autistas terá as mesmas dificuldades, ou mais, que eu. Dificuldades para se adaptar e para concluir tarefas acadêmicas, da infância até a vida adulta”, afirma.
Diagnóstico
“Fui tratada por minha mãe como uma menina diferente e com inteligência específica. Ela me mostrava arte, me fazia ler livros, me dava mapas e eu desenvolvi muitas habilidades, mas a memória episódica, certas interpretações e a fala eram mais do que diferentes”, conta Maria Matilde ao rememorar a infância. Ela se considerava uma criança precoce, com um vocabulário estranho para a idade e maneiras de agir robóticas, dentre outras características.
Com o estímulo da família, Matilde, que chegou a cursar Belas Artes, decidiu-se pelos estudos em Psicologia onde, hoje, atua no apoio terapêutico de outras pessoas com autismo. Ela desenvolveu um projeto pioneiro para atender autistas. Participou de estudos e de projetos desenvolvendo técnicas diagnósticas e de cuidados. Habilidades que ela acumula com o título de especialista, mas também com a própria trajetória e as experiências de atendimentos clínicos.
“Eu faço o diagnóstico de cerca de 350 a 400 pessoas por ano. São muitas as pessoas em sofrimento, pessoas de todas as idades”, conta. De acordo com Sidenise Estrela, pedagoga e mestre em Educação, uma a cada 100 pessoas estão dentro do espectro autista. “Hoje, o diagnóstico é mais acessível e possível de se fazer no tempo certo e, mesmo que não seja suficiente, esse diagnóstico também é dispensado pelo SUS”, declara Sidenise ao valorizar a formação de profissionais capazes de identificar características deste transtorno como outro ponto essencial.
“Isso quer dizer que vamos conviver, em algum momento, quer seja na família, na minha vizinhança, na escola, quer seja no meu trabalho, no meu âmbito social, profissional e de lazer, com alguém com TEA ou com características de TEA e, muitas vezes, a gente nem vai saber quem são essas pessoas”, declara e reforça a relevância da informação.
Matilde ressalta ainda que mulheres autistas são diferentes de homens autistas. Mulheres negras autistas são diferentes de mulheres brancas autistas e até mesmo o autismo na adolescência se faz em manobras e em funcionamentos específicos e influenciados pelas culturas e origens raciais, étnicas, econômicas e religiosas. “E, para além de tudo, compreender o autista, seja em qual nível de apoio for, como uma pessoa que existe e pertence ao mundo que, muitas vezes, parece uma selva, mas que também é nosso”, destaca.
A pedagoga Sidenise Estrela destaca também que o autismo não tem cara. “Para se ter uma vida aparentemente regular, comum, é importante que essa pessoa seja vista, inicialmente, como pessoa e não como um autista, como um nome que atribui a um transtorno”, afirma
Direitos
Ela pontua também que as pessoas com autismo, assim como qualquer cidadão e cidadã, deve ter acesso e conhecimento sobre seus direitos garantidos em lei. A Lei 12.764/2012 estabelece política nacional de proteção desses direitos exclusivamente para pessoas com TEA. A lei de 2012 prevê também que toda pessoa com autismo tem direito a tratamentos através do Sistema Único de Saúde (SUS) e através da educação.
“Todas as escolas devem ser inclusivas, devem matricular e dar todo suporte necessário e apoio para crianças e jovens com autismo. Saber que o mundo do trabalho também precisa acolher profissionais que estão dispostos a realizar qualquer ação humana dentro da empresa ou organização. Saber que os direitos de crianças, jovens e adultos devem ser respeitados”, afirma a pedagoga.
Sidenise destaca também o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a Lei 8.069/1990, que fala sobre direito à escola e à educação regular e não a uma educação especial e individualizada, fora do convívio social. Estrela tem longa experiência como professora, coordenadora e gestora de educação e alerta para a importância de entender que as pessoas de baixa renda com autismo também precisam ser vistas como sujeitos de direitos.
Para as pessoas mais pobres, é possível usufruir de direitos protetivos, a exemplo do Benefício de Prestação Continuada (BPC). Um benefício no valor de um salário mínimo pago e acessado via INSS. “Esse benefício está previsto para custear todas as necessidades básicas, como alimentação, moradia e remédio de pessoas com autismo. Este benefício é de uso da pessoa do grupo familiar para exclusivamente atender às necessidades básicas dessa criança ou jovem”, afirma.
Cuidados multidisciplinares
A pedagoga conta que a Bahia é o primeiro estado brasileiro a ter uma lei que prevê cuidados multidisciplinares detalhados para o tratamento de pessoas autistas. “Recentemente, a Secretaria de Educação (SEC) do estado divulgou que, do total de 1065 escolas da rede estadual de ensino, 576 unidades registraram matrículas de estudantes do TEA”, diz.
Ela afirma ainda que há uma estimativa de investimentos de mais de R$40 milhões na educação estadual para essas demandas. “Isso significa distribuição de recursos pedagógicos diferenciados, a formação continuada de professores, coordenadores pedagógicos e a contratação de profissionais especializados para atuação em unidade escolar e em sala de recursos multifuncionais em centros de apoio pedagógico”, declara.
Estrela reconhece que o currículo exige habilidades e competências dos educadores com conhecimentos de estratégias e metodologias, recursos, materiais, ambientes organizados e rotinas estruturadas para que a criança consiga se perceber no espaço de aprendizagem. “Essas adaptações e flexibilizações, quando necessárias, precisam contemplar o marco do desenvolvimento que a criança se encontra, contemplar sua faixa etária, as suas características pessoais, os seus gostos, os seus interesses, mas, principalmente, que atribuam significado para o processo de aprender”, afirma Sidenise.
TEXTO: Brasil de Fato