Por décadas, o café carregou a fama de ser perigoso para o coração, especialmente para quem tem arritmia. Muitos acreditavam que a cafeína podia “disparar os batimentos” e causar novas crises, o que fez médicos e pacientes deixarem a bebida de lado.
Porém, um novo estudo internacional, publicado em novembro de 2025 no Journal of the American Medical Association (JAMA), trouxe uma reviravolta surpreendente: tomar café com moderação pode reduzir o risco de recorrência da arritmia.
O que diz o estudo
A pesquisa, batizada de DECAF Trial (Does Eliminating Coffee Avoid Fibrillation?), acompanhou 200 pacientes diagnosticados com fibrilação atrial persistente após passarem por cardioversão elétrica — procedimento usado para restaurar o ritmo normal do coração.
Os voluntários foram divididos em dois grupos:
- – Um grupo manteve o consumo diário de pelo menos uma xícara de café com cafeína;
- – O outro grupo eliminou totalmente o café e outros produtos cafeinados.
Após seis meses de acompanhamento, o resultado surpreendeu os pesquisadores: 47% dos que continuaram tomando café tiveram nova arritmia, contra 64% dos que abandonaram o consumo.
Isso representa uma redução de 39% no risco de recorrência entre os consumidores moderados de café.
Outro dado importante é que o consumo de café não aumentou o risco de eventos adversos, como infarto, AVC, hospitalizações ou morte.
Os autores do estudo concluíram que o café, em doses moderadas, é seguro mesmo para quem já teve arritmia.
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Efeito protetor que ajuda
O possível efeito protetor estaria relacionado à ação antioxidante e anti-inflamatória dos compostos naturais do café e à interação da cafeína com os receptores de adenosina, que ajudam a estabilizar o ritmo cardíaco.
Além disso, pessoas que consomem café tendem a ter maior nível de atividade física, o que também contribui para a saúde cardiovascular.
Esses resultados desafiam a ideia antiga de que o café é um gatilho para arritmia. Em vez disso, ele pode exercer um papel protetor quando consumido com equilíbrio”, destacam os autores do estudo.
O café e o coração: números e contexto no Brasil
- – O Brasil é o segundo maior consumidor de café do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos.
- – Entre novembro de 2023 e outubro de 2024, o país consumiu cerca de 21,9 milhões de sacas de 60 kg, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Café (ABIC).
- – A Região Norte representa 8,8% desse total — cerca de 1,9 milhão de sacas.
- – O consumo médio nacional é de 5 kg de café torrado por habitante/ano, equivalente a duas a três xícaras por dia.
No Amazonas e nos estados vizinhos, o café faz parte da rotina diária — seja no café da manhã, em reuniões familiares ou em pequenas pausas durante o trabalho. A bebida também tem importância econômica, especialmente em municípios do sul do Amazonas e da região do Alto Solimões, onde o cultivo tem crescido nos últimos anos.
Como aproveitar os benefícios do café
- – Prefira café filtrado ou coado: tem menos gordura que o expresso.
- – Evite adicionar açúcar, leite condensado ou chantilly.
- – Limite o consumo a duas a três xícaras por dia (aprox. 400 mg de cafeína).
- – Evite o café à noite, para não afetar o sono.
- – Pessoas com hipertensão, insônia ou ansiedade devem conversar com um médico antes de aumentar o consumo.
- – Evite misturar com energéticos, pré-treinos ou bebidas que contenham cafeína sintética.
Essas orientações são reforçadas pela Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), que aponta o equilíbrio como o segredo para que o café seja aliado — e não vilão — da saúde cardiovascular.
O que é a arritmia cardíaca
A arritmia cardíaca é uma alteração no ritmo dos batimentos do coração. Em vez de bater em um compasso regular — normalmente entre 60 e 100 batimentos por minuto — o coração pode acelerar (taquicardia), ficar mais lento (bradicardia) ou bater de forma irregular.
Essas mudanças podem causar sintomas como:
- – Palpitações ou sensação de “coração disparado”;
- – Tontura ou desmaio;
- – Falta de ar e cansaço;
- – Dor ou aperto no peito.
O tipo mais comum é a fibrilação atrial, quando os átrios (as câmaras superiores do coração) batem de forma desordenada.
Essa condição aumenta o risco de AVC e insuficiência cardíaca, especialmente em pessoas com pressão alta, diabetes ou histórico familiar de problemas cardíacos.
Apesar disso, muitas arritmias são controláveis com tratamento e hábitos saudáveis, como alimentação equilibrada, atividade física e acompanhamento médico regular.
Panorama das arritmias no Brasil
- Entre 2019 e 2023, o Brasil registrou 283.970 internações por arritmias cardíacas.
- Só em 2023, foram 74.492 casos, o maior número da série histórica.
- A fibrilação atrial é o tipo mais comum, atingindo cerca de 1,5% da população adulta brasileira.
- O risco aumenta com idade, hipertensão, diabetes e obesidade.
Situação no Amazonas
De acordo com dados do Ministério da Saúde, o Amazonas registrou mais de 1.400 internações por arritmias nos últimos cinco anos.
A maior parte dos pacientes é composta por pessoas acima dos 50 anos, mas cardiologistas alertam para o crescimento de casos entre adultos jovens com sedentarismo, má alimentação e uso abusivo de estimulantes, como bebidas energéticas.

