Um roteiro digno de Dias Gomes e a sua fantasiosa cidade de Sucupira foi encerrado, nesta terça-feira (30/09), pelo Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM) ao declarar inconstitucional o artigo 1º da Lei n.º 97/2008, do Município de Ipixuna, na região do rio Juruá, que autoriza o prefeito a nomear um administrador em eventual substituição no cargo de chefia do Executivo, uma espécie de prefeito substituto.
A decisão do plenário foi por unanimidade na ação de Arguição de Inconstitucionalidade Cível levado ao Pleno pela Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Amazonas, de relatoria do desembargador Yedo Simões de Oliveira (foto).
O processo judicial começou com a ação civil pública na Comarca de Ipixuna, que julgou procedentes os pedidos para, afastando a aplicação da Lei Municipal n.º 97/2008, e anular o Decreto 051/2020, da prefeita Maria do Socorro de Paula Oliveira que nomeou Davi Farias de Oliveira para o cargo de administrador municipal e todos os atos por ele praticados. O município e o nomeado interpuseram o recurso n.º 0000314-40.2020.8.04.4501, que deu origem a ação agora julgada.
Segundo o relator, ao criar a figura do “administrador municipal”, um agente nomeado ad hoc pelo prefeito, conferindo a ele a atribuição de substituí-lo na chefia do Executivo, a lei municipal subverte a lógica constitucional.
“Ela institui uma forma de provimento derivado para o mais alto cargo do município que prescinde da legitimação democrática, permitindo que as funções de prefeito sejam exercidas por alguém sem qualquer vínculo com o corpo eleitoral, em clara burla à soberania popular”, afirma o magistrado.
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Entenda o caso ilegal em Ipixuna
Davi Farias de Oliveira é um político tradicional de Ipixuna, tendo sido prefeito em duas oportunidades. A lei considerada inconstitucional agora pelo TJAM foi promulgada por ele quando era prefeito em 1998.
Fora do cargo, em 2020 ele foi beneficiado pela própria lei que promulgou ao ser nomeado administrador municipal na ausência da prefeita Maria do Socorro de Paula Oliveira por meio do decreto 051/2020.
O caso chamou atenção do promotor de Justiça Iranilson de Araújo Ribeiro, titular da promotoria de Ipixuna na época. “Tive que ajuizar uma ação requerendo que a Justiça declarasse inconstitucional a lei de Ipixuna que permitia esse absurdo e declarar nulo o decreto que nomeou um substituto da prefeita que não tá previsto na Constituição federal de 1988”, disse o promotor.
Na peça acusatória acolhida pelo juiz da Comarca, Iranilson anotou que o novo administrador, David, é primo do ex-secretário de Governo da Prefeitura de Ipixuna. Armando Corrêa de Oliveira Filho, que vem a ser também marido da prefeita Maria do Socorro. Ou seja, era tudo uma ação entre familiares.
A justificativa apresentada pela prefeita para nomear o primo de seu marido Administrador Municipal, e que consta no decreto, foram as pretensões político eleitorais daqueles que estão na linha sucessória: o vice-prefeito, o Presidente da Câmara Municipal e o vice-presidente estão “impedidos de assumirem o cargo de Prefeito em exercício no período pré-eleitoral”.
“Dito de outro modo, como aqueles que integram a linha sucessória do Prefeito Municipal possuem pretensões eleitorais e não pretendem assumir o cargo para evitar impedimentos, criou-se a figura de ‘Administrador Municipal’, (cuja escolha fica) atribuída à discricionariedade da atual prefeita, para exercer interinamente a Chefia do Poder Executivo”, diz trecho da decisão judicial.