As relações de trabalho da profissional doméstica, no Brasil, não evoluíram como esperávamos. Apesar dos avanços na legislação trabalhista, com a Lei Complementar 150, a PEC das Domésticas de 2015 a mudança cultural ainda não é regra nas negociações com os empregadores e, com a assimetria de poder na relação, ainda há diversos casos de profissionais da área que enfrentam, diariamente, humilhações e discriminação no trabalho.
Veja, marca da Reckitt Hygiene Comercial com mais de 50 anos de tradição, que tem como alguns dos seus objetivos dar visibilidade ao problema social enfrentado pelas trabalhadoras domésticas brasileiras e contribuir com a conscientização da sociedade sobre a importância e desafios encontrados na rotina destas profissionais em regiões culturalmente distintas, realizou uma pesquisa com profissionais de todo o Brasil com o objetivo de entender os principais desafios da profissão.
O levantamento foi realizado pelo Plano CDE, empresa de pesquisa e avaliação de impacto especializada nas famílias CDE no Brasil, e contou com a participação de 522 trabalhadoras domésticas de todo o território nacional, entre os meses de julho e agosto deste ano. Para a gerente de propósito da Reckitt Hygiene Comercial, Lívia Berrocal “além de trazer maior visibilidade para o trabalho destas profissionais, a pesquisa foi realizada para entendermos com mais precisão seu universo. A partir daí, construirmos um programa de propósito que vai promover não só a reflexão, mas principalmente uma mudança de comportamento da sociedade e, consequentemente, melhores condições de trabalho para as trabalhadoras domésticas“.
O estudo aponta para o excesso de carga de trabalho que, na maioria dos casos, não condiz às 8 horas diárias e 44 horas semanais descritas na legislação. Se a trabalhadora for uma diarista o descumprimento do que foi previamente acordado é ainda mais perceptivo. Isso porque 65% das trabalhadoras que participaram da pesquisa informaram não receber hora extra trabalhada. Além disso, 82% das diaristas e 63% das mensalistas informaram que não recebem férias ou 13º salário, outra exigência da Lei Complementar 150. Outro ponto levantado por elas é que 69% das entrevistadas contratadas mensalmente têm valor descontado no final do mês, se faltarem ao trabalho algum dia.
Além do não pagamento de horas extras e da garantia destes direitos trabalhistas, é bem comum que as profissionais realizem atividades que não são de sua responsabilidade. De acordo com o estudo, 70% das diaristas e 71% das mensalistas já passaram pela situação. O levantamento também aponta que isso acontece porque há o medo de perder o emprego, conforme disseram 54% das diaristas e 52% das mensalistas. Outra questão que as trabalhadoras domésticas vivem, que não é comum em outras áreas, está no fato de que 62% das diaristas e 58% das mensalistas já tiveram o seu pagamento pechinchado pelos empregadores.
Pesquisa qualitativa
Além da pesquisa quantitativa, em todo o território nacional, o levantamento contou com uma etapa qualitativa, realizada de forma imersiva, tanto em relação ao tema quanto à vida das trabalhadoras, com a participação de 18 profissionais das cidades de São Paulo e Recife.
E na pesquisa qualitativa foi possível identificar depoimentos de trabalhadoras sobre a relação com os empregadores. “Quando foi pra receber, ela veio com valor mais baixo, e eu só ia sair de lá quando ela pagasse o combinado, mas ela também me acusou de roubo. Expliquei na portaria o que aconteceu, chorando, e soube que tinha acontecido com outras também”, desabafou uma mensalista informal de São Paulo que é casada e tem 50 anos. Para outra profissional, de 43 anos de idade, residente em Recife, “você tá ali pra agradar, não pode dizer não“, conta.
De acordo com Lívia Berrocal, o estudo também é importante para mostrar outros abusos que são cometidos pelos contratantes. “A pesquisa nos deu um panorama dos principais desafios, problemas e injustiças enfrentados por essas profissionais e, principalmente, como a nossa sociedade ainda precisa evoluir neste sentido. Diante desse cenário, o propósito de Veja quer potencializar essa importante discussão com a expectativa de que, mesmo aos poucos, a situação atual possa evoluir, trazendo uma nova realidade para elas, com direitos trabalhistas garantidos e valorização deste trabalho“, finaliza.
Para Breno Barlach, do Plano CDE, uma mudança comportamental estrutural é necessária para que esta relação trabalhista se torne justa. “A carga excessiva, o baixo pagamento e a falta do reconhecimento do valor profissional estão muito presentes nessa relação de trabalho. São elementos que, além de estarem presentes na forma como o brasileiro enxerga o serviço doméstico, foram acentuados durante a pandemia. Mesmo com a PEC das Domésticas em vigor desde 2015, apenas uma efetiva mudança cultural irá trazer a merecida transformação na rotina de trabalho destas pessoas“, analisa.
Perfil da trabalhadora doméstica no Brasil
A pesquisa realizada por Veja também possibilitou a identificação do perfil desta profissional no País. De acordo com o levantamento, 69% das diaristas e 58% das mensalistas são negras, sendo que 41% entre as diaristas e 39% das mensalistas, afirmaram que não completaram o Ensino Médio. Ainda, mais da metade das trabalhadoras tem outra pessoa na família exercendo a profissão, conforme apontaram 53% das diaristas e 55% das mensalistas.