Um diálogo das máscaras com o trabalho de construção corporal dos animais encantados que a obra apresenta. Esse é o conceito artístico da estética, dos figurinos, do corpo e da voz do espetáculo “A Ilha Profana do Cantagalo”, do Grupo Jurubebas de Teatro, apoiado pelo programa Rumos Itaú Cultural 2023-2024, que estreia no dia 10 de junho, às 19h30, no Buia Teatro Company, com entrada franca.
O Buia Teatro Company fica na rua Dona Libania, 300, no Centro, próximo ao Teatro Amazonas. A montagem tem a cidade de Borba como pano de fundo e o ritmo do Gambá, musicalidade tradicional da região.
A companhia prioriza trazer para o público um olhar lúdico e objetivo, ao mesmo tempo em que provoca com a construção não-convencional desses corpos. “Trata-se de um formato híbrido desse formato, corpo-mascarado, animalesco e, por fim, fincado com as raízes do gambá de Borba”, coloca Felipe Maya Jatobá, diretor geral do espetáculo. Os artistas Aldeir Farias e Henrique Dias assinam os figurinos do espetáculo. Aldeir é um artista parintinense e o responsável por criar as máscaras e escolher a paleta de cores do espetáculo.
“Ele é um artista que trabalha desde a confecção de alegorias à figurinos e designers de costumes e com isso nos ajuda a criar um universo visual bastante lúdico para uma peça adulta”, coloca Felipe. Já Henrique Dias, figurinista e também pesquisador de designers de costumes, traz na experiência a função de mestre sala da Mocidade Independente de Aparecida. Seu repertório visual dialoga com a presença de corpo que o “A Ilha Profana do Cantagalo” propõe. Para compor a paleta de cores da obra, a companhia pensou em cores vivas, que prendessem a atenção do público logo de cara.
“Os tons terrosos também são referência à paleta de cores da comunidade do Acará, onde desenvolvemos a parte fundamental do processo criativo. Montamos uma cenografia que lembra a beira do barranco, as palafitas e isso dialoga com o universo fantástico das encantarias, representadas por essas cores vivas”, destaca Jatobá. Os figurinos foram confeccionados com materiais em parte reciclado, descartados e que foram reutilizados para confecção de parte das indumentárias. Também foram utilizadas penas artificiais, pedras coloridas e tecidos que lembram pele de animais, tudo de forma sustentável.
LEIA TAMBÉM: Festival Close exibe 28 produções LGBT+ a partir desta quinta
Jean Palladino foi escolhido para assumir a direção de elenco e Talita Menezes assume a direção de movimento da montagem. “Talita Menezes desenvolveu um trabalho anterior com o Jurubebas e renovamos a parceria. Vencedora do Prêmio Shell, Talita traz a pesquisa no corpo animal de forma bastante relevante e isso dialoga com a nossa proposta”, pontua Felipe Jean Palladino é uma parceria que também deu certo e que o Grupo Jurubebas repete neste trabalho. “Ele tem uma pesquisa sobre o corpo para a comicidade, em especial a palhaçada. O palhaço tem preparo para o improviso, o acaso e isso a gente precisava criar também nessa atmosfera. A gente então junta essa trinca de direção: Talita (corpo), Jean (voz), e Felipe (encenação)”, completa o diretor.
Segundo Talita Menezes, a pesquisa de movimentos do espetáculo partiu da provocação da corporeidade animal, para explorar os personagens que, para além de humanos, também precisavam incorporar fisicamente as qualidades, gestos e comportamentos do animal que interpretam. “A floresta e ancestralidade também estão presente nas provocações na medida em que estes animais vem de um lugar que um ritmo pulsa e os coloca em movimento”, destaca Talita. O estudo dos movimentos nos ensaios partiu de exercícios do teatro físico e da dança: a observação e escuta do corpo foi essencial para que os atores fossem se sentindo à vontade para serem desafiados.
“A proposta dos exercícios trazia um desafio que era a resposta corporal dos atores. Assim eles foram criando e entendendo os movimentos que o corpo deles era capaz de fazer: tudo isso foi importante para que fosse construída uma intimidade para a criação da energia animal que trariam para a cena. Outro ponto foi também compreender que cada animal tem um corpo que já conhecemos no senso comum, mas que deveria ser atravessado pela característica dos animais na peça, fazendo com tivesse um comportamento único”, complementa Menezes.
Para Jean Palladino, o espetáculo possui uma dramaturgia muito imagética e cheia de subjetividades que necessitam de uma profundidade dos atores e atrizes no processo.
“Desde o meu primeiro contato, buscamos olhar para micro ações, falas, tensões de cada personagem e situação. O trabalho convoca uma atuação que foge os estereótipos atribuídos à região; procuramos uma fidelidade dos motivos que fazem cada personagem estar em cena junto da bagagem que ele apresenta na narrativa. Direciono o elenco para um trabalho de visualização desse imaginário: eles precisam ver antes de todos nós o que estão contando para, a partir daí, expandir para gestos, fala e movimentações”, pondera ele.
Sobre os pontos abordados por Jean entre a relação humanos/criaturas folclóricas, ele acredita que os encantados presentes na narrativa, assim como na vida são nossos entes, nossos antepassados e contemporâneos que vivenciam a humanidade no atual Brasil profundo. “Tanto as figuras como as pessoas têm suas subjetividades, suas ações motivadas pelos seus desejos, urgências ou deveres. Então o boto tem um desejo, uma escolha de suas ações, por exemplo. A partir desse imaginário popular abordamos essas violências presentes diariamente nos municípios do interior do Amazonas”, finaliza Palladino.