Os direitos e o cuidado com o início da vida entraram no calendário oficial do Brasil: a partir de 2023, o Governo Federal instituiu agosto como o Mês da Primeira Infância. Sobre o tema, um projeto pioneiro vem sendo desenvolvido para atendimento a gestantes e crianças na Amazônia.
Essa diretriz, de caráter nacional, tem importância redobrada quando se olha para a Amazônia: a região acumula os piores índices de desenvolvimento humano no país, de acordo com levantamento da iniciativa Amazônia 2030, especialmente em saúde e educação.
Os amazônidas mais jovens que vivem nas periferias e interiores são afetados com a escassez de vagas em sala de aula, de estrutura escolar e materiais didáticos, e pela falta de cobertura do sistema público de saúde, crucial para o desenvolvimento nessa fase da vida.
Não é possível construir um futuro de qualidade para a Amazônia sem pensar no bem-estar de seus habitantes, as gerações do agora e as que estão por vir. Por isso, a Fundação Amazônia Sustentável (FAS) desenvolve o projeto Primeira Infância Ribeirinha (PIR), do qual fazem parte um conjunto de ações voltadas ao desenvolvimento integral de crianças em áreas e comunidades remotas ao longo dos rios da região.
“O futuro da Amazônia depende do cuidado com as crianças de hoje”, afirma Virgilio Viana, superintendente-geral da FAS. Criado em 2012 a partir da troca com especialistas e experiências anteriores bem-sucedidas no Brasil, o PIR tem o diferencial de contemplar as realidades amazônicas ribeirinhas, considerando as culturas e desafios locais.
Em mais de uma década de atividade, o projeto Primeira Infância Ribeirinha capacitou mais de 500 agentes de saúde, atendeu milhares de famílias em municípios e gigantescas áreas de proteção ambiental na Amazônia, como as Reservas de Desenvolvimento Mamirauá e Amanã e a Floresta de Maués. Inspirado na iniciativa, em 2016, o Governo do Estado do Amazonas instituiu o Programa Primeira Infância Amazonense (PIA), que com o objetivo garantir o desenvolvimento físico, psicológico, intelectual e social da criança.
Agentes capacitados para atender gestantes e crianças na Amazônia
Um dos principais públicos do projeto são Agentes Comunitários de Saúde (ACS) que atendem zonas urbanas periféricas, rurais e de mais difícil acesso. Os agentes são capacitados em temas prioritários para a primeira infância, como o fortalecimento de vínculos, a importância do brincar e a redução de vulnerabilidades. O objetivo é melhorar a qualidade das visitas domiciliares para gestantes e crianças de 0 a 6 anos.
“O PIR me ajudou no trabalho com as crianças, também melhorou minha postura nas visitas, trouxe segurança para falar e técnicas para criações dos brinquedos e rodas de brincadeiras”, aponta Jackson dos Santos, agente comunitário de saúde no município amazonense de Tefé.
Somente nessa região, a FAS, capacitou 294 profissionais, sendo 203 ACS e 91 multiplicadores e gestores para a qualificação do acompanhamento e atendimento de mais de 8.000 crianças na categoria de primeira infância.
A gerente do Programa Saúde na Floresta (PSF) da FAS, Mickela Souza, considera que “o projeto Primeira Infância Ribeirinha corrobora com o fortalecimento dos Agentes Comunitários de Saúde junto às famílias ribeirinhas, configurando-se em uma excelente frente de educação em saúde para esses profissionais”.
Com o projeto, a agente de saúde Jumara Queiroz conta que aprendeu “a conduzir as etapas da visita, prezando pelo acolhimento, aplicando as intervenções e passando segurança às famílias.”
Mudanças que contagiam gerações
As capacitações de agentes comunitários de saúde e atividades diretas nas comunidades trazem benefícios na qualidade de vida não só dos mais jovens, mas de toda a população envolvida, como mostra o exemplo da comunidade Camará no município de Iranduba (AM).
“Após a capacitação do PIR, fiz as conexões entre os temas da saúde e meio ambiente e verifiquei que os surtos de diarreia na comunidade estavam associados à sujeira e à falta de higiene”, conta a ACS Meire de Souza Ramos. A agente mobilizou o povoado em mutirões para recolhimento de lixo e busca de solução contra a antiga prática de queimá-lo nos quintais. Os moradores embarcaram na ideia e conseguiram que a prefeitura iniciasse o serviço de coleta em barcos, reduzindo o número de casos da doença na comunidade.