Estudos epidemiológicos ligando uma dieta rica em frutas e legumes a um baixo risco de câncer deram origem a uma sucessão de pesquisas sobre a eficÔcia da fisetina no combate a tumores. O objetivo de vÔrios grupos de pesquisa é entender como esse flavonoide (com atividade antioxidante), presente em cebolas e maçãs, morangos e pepinos, uvas e caquis, pode combater e prevenir diferentes tipos de tumor.
Dois estudos publicados recentemente, disponĆveis em acesso aberto, buscam sintetizar o conhecimento existente sobre os mecanismos de ação do composto, alĆ©m de trazer perspectivas do seu uso no tratamento do cĆ¢ncer.
O mais recente dos trabalhos foi publicado no European Journal of Medical Research por pesquisadores chineses, enquanto o outro estĆ” disponĆvel na revista Global Medical Genetics e Ć© assinado majoritariamente por autores baseados na China, mas tambĆ©m na RĆŗssia, IĆŖmen e Estados Unidos.
A fisetina Ć© conhecida por diversas atividades biológicas, sejam anti-inflamatórias, de inibição de estresse oxidativo, neuroproteção e anticĆ¢ncer. Os efeitos foram demonstrados em vĆ”rios tipos de tumor, como de fĆgado, pulmĆ£o, de boca, gĆ”strico, colorretal, cĆ¢ncer de mama, de rim e cervical, entre outros.
Vantagens da fisetina
Estudos ao longo dos Ćŗltimos anos demonstraram muitos benefĆcios do flavonoide em cĆ©lulas tumorais, incluindo a supressĆ£o da proliferação, indução de morte celular, redução da angiogĆŖnese (a geração de vasos sanguĆneos que nutrem o tumor), inibição da migração celular e o aumento dos efeitos da quimioterapia.
Essas propriedades sĆ£o atribuĆdas ao envolvimento de numerosas molĆ©culas e vias de sinalização celular, incluindo o fator de crescimento endotelial vascular (VEGF), a proteĆna quinase ativada por mitógeno (MAPK) e o fator nuclear kappa B (NF-ĪŗB), entre outros.
Os autores do artigo do European Journal of Medical Research afirmam que estudos recentes indicam que a autofagia reduz a resistência à quimioterapia e à radiação, o que é positivo para o tratamento de câncer.
LimitaƧƵes e desafios
No entanto, as pesquisas sobre os efeitos da fisetina sobre a autofagia em tumores sĆ£o limitadas, com resultados inconsistentes. Enquanto alguns estudos mostram autofagia induzida pela fisetina em cĆ¢ncer de próstata, por exemplo, o mesmo nĆ£o se aplica ao tumor de fĆgado.
AlĆ©m disso, escrevem, as vias de sinalização celular especĆficas envolvidas na autofagia induzida pela fisetina continuam nĆ£o sendo muito bem compreendidas.
Como exemplo, os autores citam dois estudos divergentes. Enquanto um demonstra que a autofagia ocorre por meio de uma via de sinalização celular (AMPK/mTOR), outro mostra que esta ocorreria em resposta ao estresse do retĆculo endoplasmĆ”tico, por meio de outra via.
Do ponto de vista farmacológico, os autores do segundo estudo ressaltam que, embora o uso da fisetina seja uma oportunidade, ainda hĆ” diversos desafios a superar. Um deles Ć© aumentar sua biodisponibilidade e a estabilidade, um obstĆ”culo comum no uso de compostos naturais. Novos sistemas de entrega (ādrug deliveryā) e formulaƧƵes sĆ£o alguns dos caminhos possĆveis.
AlĆ©m disso, entender a farmacocinĆ©tica e a toxicidade do composto sĆ£o essenciais para seu uso clĆnico. De acordo com o grupo de autores chineses, russos e iemenitas, novos estudos sĆ£o necessĆ”rios para elucidar os efeitos em longo prazo, dosagens e potenciais efeitos adversos.
Por fim, investigar os efeitos sinergĆsticos da fisetina com outros agentes terapĆŖuticos ou modalidades de tratamento poderia aumentar sua eficĆ”cia. Isso sem falar no papel junto a imunoterapias e terapias-alvo, que podem oferecer caminhos promissores de tratamento.
āAntes de poder ser usado com seguranƧa [em combinação] com outras drogas, a influĆŖncia da fisetina no metabolismo desses fĆ”rmacos deve ser mais estudada. Futuros estudos para esclarecer essas questƵes sĆ£o necessĆ”riosā.
Encerram os autores do artigo daĀ Global Medical Genetics.
- ReportagemĀ originalmenteĀ publicada noĀ Science Arena