Iniciado nos anos 1960, o processo de expansão das igrejas evangélicas ganhou velocidade a partir dos anos 1970 e atingiu seu ápice entre 2000 e 2016. Mesmo com a desaceleração, o crescimento ainda é grande: em 2019, foram abertas 6.356 igrejas evangélicas no Brasil, uma média de 17 novos templos por dia.
É o que atesta a Nota Técnica “Surgimento, trajetória e expansão das Igrejas Evangélicas no território brasileiro ao longo do último século (1920-2019)”, divulgada pelo Centro de Estudos da Metrópole (CEM).
O documento, que integra a série Políticas Públicas, Cidades e Desigualdades, traz resultados de pesquisa conduzida por Victor Araújo, cientista político da Universidade de Zurique, na Suíça, e associado ao CEM, um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) da FAPESP com sedes na Universidade de São Paulo (USP) e no Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap).
O texto traça a evolução das várias denominações desses estabelecimentos: as evangélicas missionárias; pentecostais; neopentecostais; e as de classificação não determinada. Araújo utiliza como fonte primária de dados o Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ), que qualquer empresa, inclusive as igrejas, precisa ter no país para operar, mesmo que sejam isentas do Imposto de Renda.
“Ainda que a gente saiba que os dados são subestimados, pois muitos estabelecimentos religiosos operam na ilegalidade e não possuem CNPJ, essa base é muito importante porque permite acompanhar a abertura dos estabelecimentos desde os anos 20 do século passado”, destaca o pesquisador. “Ela também nos dá a dimensão espacial do processo, já que informa o logradouro, município e Estado de cada estabelecimento”, completa.
Para analisar o surgimento e a expansão dessas igrejas, Araújo utiliza um método computacional para detecção e classificação da razão social de mais de 150 mil templos evangélicos inscritos na Receita Federal. O algoritmo empregado permite a leitura automatizada de texto e encontra-se disponível em código aberto na linguagem de programação R. Os critérios de classificação foram desenvolvidos e validados pelo próprio pesquisador.
Os resultados obtidos nos procedimentos de validação e testes feitos por Araújo se mostraram próximos aos das estimativas oficiais sobre a população evangélica, o que indica a consistência da metodologia por ele elaborada para a execução da pesquisa. “Essa metodologia pode servir como uma alternativa aos dados de filiação religiosa coletados e divulgados decenalmente pelo Censo IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística]”, afirma ele.
Dados de 2019
A primeira Igreja Evangélica com registro ativo na Receita Federal é a Primeira Igreja Batista de Nova Iguaçu (RJ), fundada em 1922. Contudo, esse dado não significa que essa tenha sido a primeira Igreja Evangélica inaugurada no país, é apenas a primeira com cadastro e que ainda tinha um CNPJ ativo em 2019. Os dados levantados por Araújo mostram que a consolidação do Protestantismo reformado no Brasil foi lenta: em 1960, existiam oficialmente apenas 18 Igrejas Evangélicas Missionárias no Brasil, ou seja, foram criadas oficialmente menos de 20 igrejas em 38 anos. Entre 1960 e 1980, o número de igrejas classificadas nesse grupo cresceu mais de 170 vezes, atingindo a marca de 3.087 em 1980. Desse ano, até a virada do século, a expansão é contínua, mas ainda pouco acelerada. A situação muda, porém, depois dos anos 2000: o número de Igrejas Evangélicas Missionárias sai de cerca de 10 mil (2000) para 20 mil em 2015.
Em 2019, dado mais recente do estudo, o Brasil registrou a existência de 109.560 Igrejas Evangélicas, das mais diversas denominações, presentes em todos os Estados e no Distrito Federal. “Tal ciclo foi impulsionado pelo forte crescimento das Igrejas Evangélicas Pentecostais, que, em 2019, tinham 48.781 templos em todo o território nacional, contra 22.400 das Igrejas Evangélicas Missionárias e 12.825 das Igrejas Neopentecostais”, constata trecho da NT. Outro fator importante levantado pela NT é que “o crescimento do Pentecostalismo no Brasil tende a alavancar o crescimento de seus pares de outras denominações, ou seja, conformou-se um equilíbrio no mercado religioso brasileiro em favor do segmento evangélico”.
No que se refere à distribuição espacial, a NT revela que, em 2019, as cinco Unidades da Federação (UFs) com maior número de Igrejas Evangélicas por 100 mil habitantes eram: Espírito Santo, Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul, Rondônia e São Paulo. Esses Estados têm mais de 60 igrejas por 100 mil habitantes. “Não por coincidência, essas são as UFs mais próximas de completar a transição religiosa, quando nenhum outro segmento religioso será maior do que o grupo composto pelos evangélicos”, aponta a pesquisa.
A Nota Técnica “Surgimento, trajetória e expansão das Igrejas Evangélicas no território brasileiro ao longo do último século (1920-2019)” pode ser acessada em: https://centrodametropole.fflch.usp.br/sites/centrodametropole.fflch.usp.br/files/cem_na_midia_anexos/NT20.pdf.
- Com informações do CEM, um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão da FAPESP.