Em uma noite de temperatura amena, pouco vento e céu estrelado via-se centenas de pessoas caminhando com camisas pretas, jeans surrados e coturnos brilhosos na avenida Constantino Nery — Zona Centro Sul de Manaus — em direção à Arena da Amazônia. A “procissão” de fiés rockeiros misturava-se com o engarrafamento, os ambulantes e as famosas barracas de “churrasquinho de gato”. Cena tipicamente brasileira, mas que há muito não acontecia com maior frequência na capital amazonense.
Depois de dois anos da maior crise sanitária do mundo, o ramo do entretenimento voltou a crescer. No Amazonas, assim como no resto do país, a retomada parece ser forte e apressada — quase um sinal de ansiedade para aproveitar tudo aquilo que foi perdido nos últimos anos. Festival de Parintins, Garota VIP, Samba Manaus, Joelma e tantos outros são parte dessa agenda crescente do setor.
Mas o show da banda lendária do rock, Guns N’ Roses, nesta última quinta-feira, dia 1º de setembro, foi um divisor de águas — uma celebração para marcar a vontade e a esperança de uma cidade que quer permanecer viva. Os milhares de fãs em volta da arena, na típica cena descrita acima, são os sintomas de uma capital extasiada e vibrante, com cultura diversificada e eventos variados.
É estranho para nós, enquanto manauaras, vivenciarmos estes cenários porque parece algo que não nos pertence ou algo distante, que só poderia acontecer no eixo Rio-São Paulo. De certo modo, essa não é a primeira vez de um show internacional em Manaus, mas é a primeira vez em que se fala com maior frequência sobre a vontade em aproveitar-se da forte retomada do setor do entretenimento para encaixar a cidade na rota de shows no Brasil.
Quanto vale entrar para a história?
Apesar de não lotar completamente a Arena da Amazônia, o show ficou na história e eternizou um encontro entre banda e fãs. Afinal, esse encontro foi permeado de primeiras : primeira vez da banda no Amazonas, primeiro show internacional de muitas pessoas e primeiro show do Guns N’ Roses na turnê da América Latina. É especial ainda porque sabemos das dificuldades logísticas e financeiras para encaixar atrações como essas em uma das regiões mais afastadas do país, consagrando-se como uma raridade. Apesar de todas as expectativas, pode ser algo que não volte a acontecer.
O show de quase três horas foi uma mistura enérgica e pulsante de rock e baladas românticas — uma caractéristica única das bandas dos anos 80. É impossível ficar parado em “Welcome To The Jungle” e não sentir nostalgia em “November Rain” ou “Don’t Cry”. Todo o setlist foi costurado por momentos de improviso e dedilhados de Slash, que fez um show à parte — foram vários minutos de solo de guitarra para mostrar o porquê dele ser um dos melhores do mundo.
Apesar de tocarem seus maiores hits, eles também incluíram covers (I Wanna Be You Dog da banda The Stooges) e inéditas (Absurd e Hard Skool). Inclusive, talvez essa seja a marca de “Guns N’ Roses”: uma mistura (muito boa) do passado e do presente — um legado de composições bem feitas que atravessam gerações por sua qualidade sonora e memória afetiva.
É impossível não lembrar dos pais e da reunião de família no fim de semana nos primeiros segundos de “Sweet Child O’ Mine”. São nesses detalhes que o rock faz a união de todos, sem qualquer discriminação e são esses sentimentos que deixam pitadas de esperanças para novas experiências no coração da Amazônia. Esse é uma alerta de expectativas, de anseios, sonhos e desejos para novas realizações na cidade de Manaus.